
A Fundação Portuguesa do Pulmão (FPP) realizou entre os dias 23 e 24 de outubro, o seu VI Congresso, que este ano teve como palco o Auditório dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa. À semelhanças de anteriores edições, a iniciativa contou com a participação de centenas de profissionais de saúde. Ao logo de dois dias, médicos de diversas especialidades, enfermeiros, fisioterapeutas, farmacêuticos, cardiopneumologistas e outros técnicos de saúde participaram nos diferentes painéis, que este ano se centraram na abordagem de quatro temas relevantes da atualidade: a qualidade do ar e a saúde respiratória, as infeções respiratórias em Portugal, a oxigenoterapia de longa duração e a reabilitação respiratória. Em entrevista ao nosso jornal, Artur Teles de Araújo, presidente da FPP, fez o balanço de mais uma edição de um congresso que já conquistou um lugar de destaque no calendário de eventos científicos nacionais.
A sessão inaugural do VI Congresso da Fundação Portuguesa do Pulmão ficou marcada pela conferência proferida pela Professora Cristina Bárbara, sobre os principais desafios que se colocam à saúde respiratória em Portugal.
Na sua intervenção, a coordenadora do Programa Nacional para as Doenças Respiratórias recordou as metas preconizadas pelo Programa, entre as quais se destacam a redução em 10% da taxa de internamento por doenças respiratórias crónicas até 2016 e a diminuição em 2% da morbilidade e mortalidade associadas a estas patologias.
Outro dos objetivos do Programa, sublinhou ao nosso jornal Artur Teles de Araújo, presidente da SPP, é a melhoria da acessibilidade dos doentes respiratórios crónicos à prestação de cuidados de saúde, meta que segundo o pneumologista passa pela elaboração e implementação de uma rede de referenciação para estas doenças. Em simultâneo, defende-se no documento disponível na página na internet da Direção-Geral da Saúde, será necessário intervir no sentido de se aumentar o diagnóstico através do aumento em cerca de 30% da acessibilidade às espirometrias efetuadas nos cuidados de saúde primários e “promover a prevenção secundária e terciária das doenças respiratórias crónicas, mediamente a elaboração de planos específicos em 100% das regiões de saúde”.
A qualidade do ar que respiramos
“A promoção da saúde respiratória através da intervenção em fatores determinantes da mesma é uma das prioridades da Fundação Portuguesa do Pulmão, tendo sido, pois, um dos temas dominantes do programa da VI edição do Congresso. A qualidade do ar que respiramos no interior e exterior dos edifícios foi o tema de um dos painéis que contou com a participação do Professor Carlos Borrego, da Universidade de Aveiro, que abordou os fatores que interferem na qualidade do ar exterior e da Dra. Ana Margarida Costa, também da Universidade de Aveiro, que falou sobre os agentes de poluição nos ambientes interiores”. O objetivo, explicou ao nosso jornal Artur Teles de Araújo, foi encontrar pistas de como “podemos melhorar a qualidade do ar que respiramos quer no exterior quer no interior dos edifícios”.
Na sua intervenção, Carlos Borrego enumerou os fatores que interferem na qualidade do ar exterior, salientando o papel poluidor do tráfego e também outras fontes de poluição que embora com menor peso devem ser combatidas, como a queima de biomassa em lareiras, entre outras.
Outro dos temas abordados no VI Congresso, “muito em colaboração com a Quercus, é um problema que tem também de alguma forma a ver com a qualidade do ar que respiramos e que é o problema do amianto, presente em muitos edifícios em Portugal”, referiu ao nosso jornal o também presidente do Observatório Nacional das Doenças Respiratórias. Para falar abordar o tema, a organização do Congresso convidou a Professora Ema Sacadura Leite, da Escola Nacional de saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa que destacou as repercussões na saúde respiratória da inalação de fibras de amianto, designadamente a fibrose pulmonar por exposição prolongada ao abesto, que embora pouco frequente, tem registado um aumento do número de casos e o mesotelioma, um tumor raro quase sempre relacionado com a exposição a amianto. No painel foram também salientados os cuidados que devem ser tidos em conta na remoção do amianto. Uma tarefa que de acordo com Teles de Araújo, “só pode ser realizada por empresas certificadas, sob pena de ser maior o risco associado à remoção do que o de nada fazer”.
A evolução das doenças do pulmão em Portugal foram abordadas no VI Congresso em dois grandes grupos: “o das doenças infeciosas, que é um problema que em Portugal é muito mais prevalente do que noutros países europeus que nos servem de comparadores, nomeadamente no que respeita à pneumonia, que entre nós está associada a uma elevada mortalidade. O envelhecimento da população será, certamente, um dos fatores que influencia esta mortalidade, mas poderão existir outros, que importa identificar”, aponta Teles de Araújo.
O segundo grupo abordado foi o da tuberculose, relativamente ao qual “estamos um bocadinho melhor do que há alguns anos atrás. Este ano entrámos, pela primeira vez, no grupo de países com baixa incidência”, destaca o presidente da SPP, para logo acrescentar: “temos que ver se essa meta se consolida e prestar particular atenção aos núcleos que ainda não atingiram esse patamar, como as regiões de Lisboa e do Porto, que apresentam incidências ainda elevadas”.
Acompanhamento do insuficiente respiratório crónico: uma prioridade!
Outro dos temas em destaque no Congresso foi o do acompanhamento do insuficiente respiratório crónico, área considerada prioritária pela Fundação Portuguesa do Pulmão e em que o nosso país registou progressos assinaláveis no que toca aos cuidados respiratórios domiciliários. Segundo Teles de Araújo, nesta área, “estamos ao nível dos países mais desenvolvidos da Europa”, pesem embora alguns «problemas logísticos» que vão surgindo aqui e ali e que é preciso resolver.
Uma outra vertente relevante dos cuidados respiratórios é a da reabilitação respiratória, relativamente à qual, muito embora exista evidência de que melhora a qualidade de vida dos doentes e constitui um fator decisivo para um curso mais favorável da doença, com diminuição das agudizações e dos internamentos, praticamente não é praticada em Portugal. Segundo o presidente da FPP, “apenas 0,1% dos doentes que deles poderiam beneficiar têm de facto acesso aos mesmos, o que coloca o nosso país num patamar muito mau”.
Mais a mais, aponta o pneumologista, estamos a falar de tratamentos custo/efetivos, que permitem reduzir a mortalidade e os custos associados às agudizações e aos internamentos. Isto para já não falar nos custos de absentismo que se poderiam evitar com a estabilização dos doentes.
As razões para a lacuna resumem-se, segundo Teles de Araújo, a uma realidade: não há serviços de reabilitação respiratória nos hospitais. Dos cerca de 11 centros que existiam, restam cinco ou seis. Não há resposta nem no sector público, nem no privado, insiste o especialista que defende uma aposta forte nesta vertente.
Outra área a merecer cuidados redobrados é a dos cuidados respiratórios domiciliários, relativamente aos quais começam a sentir-se algumas tentativas de restrição com o objetivo de reduzir despesa. “A pressão é muita, mas devemos ter em consideração que de modo algum se deve diminuir a qualidade dos cuidados. O preço não pode ser tudo… Temos que chamar a atenção das autoridades para a necessidade de se manter a qualidade destes cuidados, que são essenciais”, conclui Teles de Araújo.
Por favor faça login ou registe-se para aceder a este conteúdo
Qual é a relação entre medicina e arte? Serão universos totalmente distintos? Poderá uma obra de arte ter um efeito “terapêutico”?